Algoritmos Musicais

 

A criatividade é essencial para a criação de qualquer expressão artística. Dentre as diversas formas de arte, a música destaca-se, sendo a mais difundida. E, por tocar no intelecto e na emoção humana, a composição de música por computador é um desafio às áreas de pesquisa em inteligência artificial e computação musical. Esse desafio é tão grande que, ainda hoje, poucos foram os avanços na área de simulação convincente da criatividade.

Dentre as diversas áreas de pesquisa em ciência da computação, sempre houve um foco especial à implementação de sistemas com intuito de simular a inteligência e criatividade humana. A inteligência artificial sempre se preocupou com o desenvolvimento de sistemas que ajudem a resolver problemas, do mesmo modo como os humanos raciocinam sobre o assunto. Outra área pesquisada pela inteligência artificial é a simulação da criatividade humana pelo computador.

Existe um algoritmo chamado “Peachnote” que calcula, a partir de um vasto banco de dados, a probabilidade de três notas em sequência terem sido compostas em certo período da história da música ocidental – pertencendo a uma obra barroca, clássica, romântica ou contemporânea.

Mais de 20 mil canções já foram adicionadas ao acervo – e o truque é nada mais que um palpite. Para adivinhar o período das notas, o algoritmo leva em conta os padrões de notas ou semitons da sequência tocada, para buscar canções similares no catálogo e determinar a época de origem do áudio reproduzido. Obras barrocas (de 1700 a 1770), por exemplo, costumam conter a sequência de notas dó, fá, sol, si e ré.

Mas o “Peachnote” pode não servir apenas para entretenimento ou pesquisas musicais. Estudos na área de reconhecimento de áudio já levam médicos a diagnosticar certas doenças ou estudar regiões do cérebro apenas ao executar gravações da voz do paciente em certas máquinas.

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(Interface do algoritmo Peachnote)

 

A composição musical está inteiramente ligada ao processo criativo e inovador das pessoas e os meios utilizados para a sua divulgação. Na era digital, aonde as plataformas de streaming reinam e vinculam as novas formas de se fazer e ouvir música de maneira muito rápida e dinâmica, há várias formas de como divulgar uma obra musical e os artistas precisam estar antenados para não ficarem obsoletos.  Se olharmos para a história da evolução musical poderemos observar as transições e mudanças graduais que a música foi tendo, desde os instrumentos, ritmos e gêneros até as formas de criação e divulgação em larga escala. As primeiras noções de teoria musical, e isso inclui a partitura, não deixam de ser algoritmos que serviram para a perpetuação e desenvolvimento do que existe hoje e se define como música.

 

Podem-se dividir os meios de composição algorítmica de muitas formas diferentes, e não há um consenso sobre essa divisão. É possível analisar como o algoritmo entra no processo de composição, e assim pode-se dividir em música composta pelo computador e música composta com o auxílio do computador. No primeiro caso, o algoritmo faz as próprias escolhas durante o processo. No segundo, os algoritmos apenas servem de auxílio ao compositor, ao qual coordena o processo de composição. Com o advento e evolução dos computadores no século XX, começaram a surgir trabalhos de composição algorítmica gerados completamente por computadores, como é o caso dos trabalhos produzidor por Lejaren Hiller, John Cage e Leonard Isaacson entre 1955 e 1956.

 

Pode-se também categorizar a composição algorítmica a partir dos resultados da composição. Nesses casos, os algoritmos podem prover informações para instrumentos musicais ou devem possuir maneiras independentes de síntese de som. Existe também a possibilidade de algoritmos que provenham ambos. Por exemplo, a execução de um algoritmo pode resultar em uma partitura, que pode ser utilizada por um instrumentista posteriormente, pode gerar um arquivo do tipo MIDI, ou então pode gerar o áudio através de uma mídia, que será executada por um computador ou outro dispositivo capaz de reconhecê-la, como um arquivo MP3. Mas até que ponto os algoritmos das plataformas digitais influenciam o público? quando os serviços de streaming priorizam o que quer que seja que os dados mandam os assinantes ouvirem, a marca musical e pessoal de um artista passa a valer menos, e a capacidade de selecionar sons que representam músicas desejáveis, em termos algorítmicos, torna-se crucial. Podemos ver esses exemplos em plataformas como o Youtube e o próprio Spotify, aonde já foi comprovada a existência de “fazenda de cliques” com a intenção de viralizar conteúdos, independente da qualidade e pesos artísticos.

 

No que diz respeito ao uso de algoritmos para gerar uma composição, é interessante notar o quanto essa discussão se assemelha com o uso dos mesmos no universo jornalístico. Algoritmos de fato são proativos e capazes de suprir a necessidade de profissionais da área da comunicação? Assim como, será a eficácia dos algoritmos suficiente para substituir o trabalho de um compositor? Pois bem, é notório que os algoritmos podem servir como bons auxiliares em ambos os casos, mas da mesma forma que um jornalista tem capacidade não apenas de compilar dados e informações, mas de analisá-las e refletir sobre elas criticamente, a música precisa de mãos, corações e cérebros humanos para que haja um sentimento genuíno expresso através daqueles sons. Em diversas tentativas de se aperfeiçoar a composição por algoritmos, as conclusões sempre acabam girando em torno do mesmo ponto: As composições são frias e distantes de uma expressividade.

 

Dentro da história, os algoritmos estão presentes na música desde os primórdios das primeiras teorias e partituras, e vêm se reinventando de maneira muito rápida, através das novas tecnologias digitais. A criatividade humana impulsiona essas mudanças, porém, os algoritmos composicionais quanto à maneira como eles processam os dados musicais e pela sua estrutura. Por outro lado, os algoritmos composicionais feitos por computador ainda encontram muitos obstáculos, pelo fato de serem de grande complexidade a implementação de sentimentos, emoções e intenções em máquinas autônomas.

 

 

 

Indicações e referências:

 

Lejaren Hiller: Computer Cantata (1963) – (https://www.youtube.com/watch?v=85fvyWJFq20).

Minstrel: Composição Algorítmica para Leigos em Música – MATHEUS MARCHINI (https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/147613/000999689.pdf?sequence=1).

Aprendizagem de Maquina: Supervisionada ou Não Supervisionada? (https://medium.com/opensanca/aprendizagem-de-maquina-supervisionada-ou-n%C3%A3o-supervisionada-7d01f78cd80a).

Textos Saad, B. Algoritmo Curador; D’Andrea, C. Em busca das redes sociotécnicas.

Dançando com o Silêncio.

O tempo é percursor de mudanças, e, em linhas gerais, seguindo uma lógica otimista, mudanças acarretam  modernização. Em uma atualidade que  segue o fluxo desse tempo modernizador, novas formas de lidar com dispositivos do cotidiano vem sendo criadas tão rapidamente que as novidades são muito frequentes, até para os indivíduos mais conectados.

Você já imaginou ir para uma “balada” e não necessariamente escutar a mesma música que as outras pessoas? Pois isso é tão possível de acontecer, que vem se tornando um tipo de festa muito popular na Europa, já chegando no Brasil, especificamente em São Paulo. As ditas Silent Disco ou Baladas Silenciosas, criadas em 1990 por ativistas preocupados com os reflexos da poluição sonora, disponibilizam para todos headphones que possibilitam a cada individuo escolher ouvir qual dos DJs que estão tocando na festa,  podendo, inclusive, controlar o volume da música. Se trata de uma individualização dentro de um ambiente compartilhado, provando que as estranhezas fictícias retratadas na série exibida pelo canal Netflix, Black Mirror, está bem próxima a nossa realidade. Cada pessoa dançando no seu próprio ritmo, na sua própria frequência, e no seu próprio volume. Para aqueles que não estão  com o fone de ouvido, parece que todos estão dançando no silêncio.

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O aproveitamento da festa divide opiniões. É inovador, moderno e aparentemente muito divertido. A questão é que deixa as pessoas em frequências diferentes, sem que compartilhem igualmente daquele instante. Embora, a depender da perspectiva, isso não seja  não ser um fato negativo.  Comprova  como a mobilidade de utensílios tecnológicos vem sendo realizada, redefinindo estruturas arcaicamente estabelecidas.

 

Senhores passageiros.

Já é comprovado, com uma grande gama de exemplos, que as fronteiras entre o espaço conhecido por nós como físico, etéreo e o cada vez mais explorado e potencializado ciberespaço vêm se dissolvendo, criando assim universos inteiramente conectados, sem distinção.

Umas das principais formas de representação dessa união entre o espaço físico e o digital são as mídias locativas. Segundo Lúcia Santaella, mídias locativas são tecnologias sem fio, tecnologias de rastreamento e de posicionamento que permitem que a informação seja ligada ao espaço geográfico. A navegação na internet, fenômeno máximo da globalização a nível de comunicação, é ancorada na nossa localização geográfica. Segundo André Lemos, “na fase atual da internet, a informação é sensível a lugares e objetos”. Temos a possibilidade de explorar o global, mas o local baliza o que vamos encontrar nesse ambiente infocomunicacional.

No nosso dia-a-dia, temos os aplicativos de celular como mídias locativas mais influentes. De transporte – Uber, 99 Pop, CittaMobi – a relacionamentos – Tinder, Happn – os apps que funcionam por geolocalização estão incorporados ao nosso cotidiano.
Além disso, essas mídias visam processos de socialização que geram, além de um espírito comunitário, um resgate da experiência pessoal de contar histórias e na recuperação da memória coletiva.

Nessa perspectiva de agregar conteúdo informacional a um local, criar laços entre pessoas-lugares e pessoas-pessoas através da tecnologia, mas também trazendo uma crítica à ela, o cantor e compositor baiano Lucas Santanna desenvolveu o seu sétimo álbum, lançado em 2017. A construção do álbum em si já é disruptiva: com recursos fonográficos gravados em situações cotidianas como restaurante, avião, praia, o álbum desenha uma narrativa sobre histórias de amor, a arte do desencontro, introspecção e vários outros assuntos que permeiam ordinariamente a vida humana.

Para o lançamento de seu álbum que foi nomeado modo avião, com o intuito de mostrar que precisamos de uma desconexão consciente dos aparelhos eletrônicos que nos tomam os dedos, Lucas Santanna utilizou o recurso das mídias locativas: realizou em parques de algumas capitais do Brasil o evento cujo objetivo era que as pessoas deitassem em pufs, e ouvissem as músicas de sua composição intercaladas com diálogos, ruídos, histórias, durante aproximadamente 40 minutos via fones Bluetooth que utilizam a tecnologia de preenchimento de áudio de cinema e o microfone binaural para a gravação, provocando assim, a sensação de estar dentro do ambiente no qual a história está sendo contada.

Ao propor a experiência modo avião para os ouvintes do seu trabalho, Lucas Santtana colocou como objetivo desconectador as pessoas de seus aparelhos eletronicos, o que aconteceu, na verdade, foi a sintonização  de todas elas numa só frequência com a ajuda de uma ferramenta eletronica locativa.

BIG BROTHER/SUPER SISTER – De olho em você!

Qual a importância e relevância da busca na vida humana e até que ponto essa ação pode acarretar mudanças pessoais? Ora bolas, o ser humano é feito de buscas e são elas que nos movem o tempo inteiro desde sempre. Mas como a crescente evolução e utilização dos ambientes digitais online, tanto móveis quanto desktop, interferem na orientação do que buscamos e escolhemos? Estamos deixando rastros na internet o tempo inteiro e esses buscadores digitais sabem cada vez mais sobre os nossos gostos, lugares que visitamos, trajetos diários, preferencias, ou seja, sobre nós mesmos.

O Google é uma das maiores empresas dentro do universo digital e uma das mais utilizadas ferramentas de pesquisa do mundo inteiro. Quem nunca, diante de alguma dúvida sobre determinado assunto ou termo específico, falou a famosa frase: “Peraí, vou dar uma googlada e já te respondo”? Essa possibilidade de poder buscar por conteúdo de maneira rápida torna as coisas realmente práticas para muitos usuários.

Agora vamos imaginar que você quer comprar uma bicicleta e está procurando em vários sites a mais barata dentro do seu gosto e preferência. Em determinado ponto você se cansa, cancela a busca e vai visualizar seu perfil no Facebook para conversar com algumas pessoas. Mesmo depois de encerrar a sua pesquisa de bicicleta e estar navegando em outros sites, você vai ser importunado com uma enxurrada de pequenas janelas com anúncios sobre propagandas de bicicletas que vão aparecer em vários sites que você navegue, inclusive no próprio Facebook. Isso não ocorrerá, é claro, se ao menos você estiver usando um bloqueador de propagandas no seu navegador web ou navegar no modo anônimo.

O Google decidiu responder às dúvidas de quem sempre imaginou como funciona seu sistema de buscas. A empresa colocou no ar um infográfico que explica passo a passo o funcionamento da ferramenta. O infográfico, desenvolvido em HTML5, detalha o processo desde o momento em que o usuário digita algum termo no campo de buscas, até a página de resultados. Primeiro, o Google detalha o sistema de rastreamento e indexação das 30 trilhões de páginas da internet, que é realizado por meio dos links nas páginas e organizam o conteúdo em um índice, que, segundo eles, já tem mais de 100 milhões de gigabytes. Em seguida, entram em jogo os algoritmos para identificar o que o usuário procura com sua busca. Entram em ação os corretores ortográficos, por exemplo, e outros recursos do buscador da empresa. Após identificar o conteúdo, procura-se no banco de dados as informações relacionadas. O buscador então identifica e ranqueia os sites de acordo com os critérios como qualidade de página, ‘frescor’ do conteúdo, se a página é compatível com o SafeSearch, tradução e a busca universal, em todos os serviços do Google.

Esse tipo de evento pode acontecer também em sites e plataformas de música online, como o Youtube ou o Spotify, mas de maneira diferente dos sites de busca como o Google. Essas outras plataformas fazem apenas recomendações musicais de gêneros ou artistas que estejam dentro da mesma esfera musical do seu histórico de buscas ou que você curte. Digamos que você busque um artista no Youtube e escute algumas de suas músicas, nos vídeos relacionados que aparecem ao lado estarão, além do próprio conteúdo desse artista, outros conteúdos de artistas que estão relacionados ao gênero, época ou contextos do artista que você tinha procurado. Dessa forma, as próprias plataformas usam desses artifícios de recomendação para a difusão de conteúdo entre os usuários. Lembro de um dia estar ouvindo um álbum de um artista dos anos 60 de blues, o álbum já estava chegando ao fim e na recomendação do próximo vídeo, o Youtube tinha posto um álbum de uma banda de blues também dessa época e que eu nunca tinha ouvido falar na vida. A priori, o nome e imagem do álbum da banda aguçaram a minha curiosidade, e para a minha surpresa foi um grande achado. Dessa época para cá, descobri muita coisa boa sobre música e artistas que não conhecia graças às recomendações. Obrigado Youtube.

Mas também me pergunto, até que ponto as recomendações feitas pelo Google e Spotify, por exemplo, não me privam de descobrir outros mundos, outros estilos, outras informações, fazendo me sentir preso numa bolha social, e o quanto estou sendo vigiado/observado em relação aos meus gostos quando pesquiso ou escuto algo? Me sinto num sistema panóptico. Calma! Uma breve pausa para explicar o que isso significa… Aliás, Focault (2009) explica melhor que eu quando diz que “O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural dessa composição. O princípio é conhecido: na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar.”

            Talvez imagens mostrem melhor o que é um panóptico:

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Modelo de Panóptico
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O Facebook e o panoptismo

Somos vistos, mas não vemos; somos objeto de uma informação, onde o panóptico pode ser utilizado como máquina de fazer experiências. Enquanto consumimos produtos/serviços, nossos comportamentos são monitorados e avaliados, servindo como um banco de dados que possibilita traçar informações mais precisas e com isso oferecer um produto/serviço “mais adequado” para os usuários. Mas será que realmente tem funcionado desse jeito?

De volta ao Spotify… Hoje, há muitos pesquisadores publicando seus estudos sobre os sistemas de recomendações e filtragem colaborativa das redes sociais. Dentre eles, citamos Sander Dieleman (2014), que em sua pesquisa sobre “Recommending music on Spotify with deep learning”, aborda que:

“O Spotify já usa um monte de fontes de informação e algoritmos diferentes em seu pipeline de recomendação, então a aplicação mais óbvia do meu trabalho é simplesmente incluí-lo como um sinal extra. No entanto, também pode ser usado para filtrar outliers a partir de recomendações feitas por outros algoritmos. Como mencionei anteriormente, os algoritmos de filtragem colaborativos tendem a incluir faixas de introdução, outras faixas, músicas de capa e remixes em suas recomendações. Estes poderiam ser filtrados efetivamente usando uma abordagem baseada em áudio. Um dos meus principais objetivos com este trabalho é possibilitar a recomendação de música nova e impopular. Espero que isso ajude as bandas mais conhecidas e futuras, e que nivelará o campo de jogo, permitindo que o Spotify recomenda a sua música para o público certo.” (traduzido no GoogleTranslate)

Algumas listas de reprodução são baseadas em similaridade, e com isso, de acordo com Oord, Dieleman e Schrauwen (2013), “a recomendação automática de música tornou-se um problema cada vez mais relevante nos últimos anos, uma vez que muita música já é vendida e consumida digitalmente. A maioria dos sistemas recomendadores contam com filtragem colaborativa. No entanto, essa abordagem sofre com o problema do cold start: ele falha quando nenhum dado de uso está disponível, por isso não é eficaz para recomendar músicas novas e impopulares”. (traduzido no GoogleTranslate)

Diante de tantas informações, nos perguntamos: até que ponto seremos vigiados e analisados para que possamos obter uma “recomendação profunda de música baseada em conteúdo”? Até onde somos capazes de ir, e cederemos nossas informações valiosas sobre quem somos, o que pensamos e nossos objetivos de vida, em troca de produtos/serviços cada vez mais personalizados, desenvolvidos por sistemas que parecem nos conhecer melhor que nossos pais? Você está pronto para isso? Releia o contrato e assine “se quiser”!

Referências:

Foucault, M. O panoptismo. In: _____. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Petrópoles: Vozes, p. 186-214, 2009.

Como funciona a pesquisa do Google

Entendendo o mundo dos buscadores 

Recomendações de música algorítmica no Spotify

Recomendar música no Spotify com aprendizado profundo

Resumo Recomendação profunda de música baseada em conteúdo

 

 

“Nós” Somos A Revolução.

Já intrínsecos à vida da grande parte da população mundial, os objetos tecnológicos como celulares e computadores, e as redes de conexão dentro do ciberespaço como o Facebook e Twitter, têm ganhado cada vez mais espaço dentro de cada ação cotidiana nos contextos mais variados no mundo todo. O que não quer dizer que a protagonizam.

Por consequência, muitas discussões surgem em torno do uso destes instrumentos não-humanos, como por exemplo sua supervalorização, colocando-os como principais provocadores da ação, ou uma visão mais antropocêntrica, que coloca os humanos no topo das ações realizadas cotidianamente. Diante disso, o que se percebe é uma polarização, uma dicotomia que separa os objetos não-humanos dos sujeitos, na medida em que se “passifiza” um e “ativa” o outro. É certo dizer que em alguns momentos haverá sim um objeto que só sirva para mediar, que seja passivo, porém, primeiramente é preciso entender que os sujeitos já têm uma relação híbrida com o objeto, que existe uma dependência mútua onde nunca poderemos responsabilizar somente um pela realização da ação.

De acordo com Lemos (2011), “o sujeito não se mistura ao objeto e, para ser sujeito, deve mesmo ser o mais ‘independente possível’ dos objetos, deve se livrar das amarras para achar o seu ‘núcleo’ velado no interior. Esse é o ponto crucial do equívoco: a dicotomia que separa o sujeito e objeto (como se isso fosse possível!). No entanto, se retirarmos os objetos, não encontraremos mais sujeitos!  

Dentro desse hibridismo e dessa dependência mútua, já nos encontramos atrelados aos nossos aparelhos celulares de certa forma que apenas dois dias sem eles são suficientes para uma pessoa conectada perceber as faltas e os benefícios que certas funções podem trazer, e, pensando na hipotética extinção das mesmas, podemos reconhecer o quão significativas elas são, entendendo-as não como essenciais, mas como muito importantes.

Há, quase sempre, outras alternativas e meios para reproduzir o que seu celular faz pra você, mas o caminho disso pode ser mais longo e trabalhoso. No âmbito musical, por exemplo, a ausência que poderia ser mais sentida seria a dos streamings que seguem a linha do Spotify, aplicativos que revolucionaram o ato de ouvir música, pois permitem aos usuários uma acessibilidade muito simplificada a músicas e artistas ao redor do mundo, comparados a CD’s físicos e vinis, difíceis até mesmo de serem transportados ou organizados, e também para os próprios músicos, que podem divulgar e expandir suas obras mais facilmente, fariam uma grande falta. É cômodo, prático e incrível ter em mãos uma infinidade de opções em apenas um aplicativo, onde você pode montar uma playlist baseada em suas preferências, sentindo também influências e produções de outras pessoas. Trata-se de uma das muitas funções do celular que não limita o usuário, expande horizontes em uma relação de suposta dependência, mas, hoje sem ele, as opções seriam limitantes.

Imagina uma viagem de carro para uma cidade litorânea com uma trilha sonora. Como levar e reproduzir dentro do carro todos os CD’s que você gosta de ouvir? Há espaço físico para a bagagem, passageiro, cachorro, sombreiro, caixa térmica e além de tudo isso os seus 50 CD’s? E ter que parar de dirigir para trocar os CD’s ou depender de alguém para fazer, seria confortável? Ou é muito mais cômodo, prazeroso e prático ter em uma única plataforma a possibilidade de reproduzir mais de 30 milhões de músicas disponíveis no streaming? Se retirarmos os objetos que usamos hoje, nos reconheceremos como sujeitos? Como seria ficar uma semana sem ouvir música pelo celular? Provavelmente utilizaria o rádio, toca-discos ou outro meio. Mas e se nem isso pudesse fazer, como você se sentiria? Aceita o desafio?

 

Referência:

Lemos, André. Things (and People) Are The Tools Of Revolution! Revista poliTICs. Rio de Janeiro: Instituto Nupef, nº. 09, Abr. 2011.

Meu, Seu e/ou Nosso?

Questão política, a discussão sobre direitos autorais cresce exponencialmente com o advento da internet. O ambiente digital cibernético, proporcionando horizontalização e encurtando distâncias comunicativas, e, com abundância de ferramentas, põe em xeque o Copyright. A crise nesse modelo é tipicamente inerente à cibercultura.

De acordo com o Wikipedia, “em 1710, entrou em vigor a primeira lei de direitos autorais conhecida, o Copyright Act, baixado pela Rainha Ana da Inglaterra em 1709, que dizia respeito apenas a livros”. Ao longo dos anos foram realizadas ampliações e aperfeiçoamentos na legislação. Quanto aos direitos autorais no Brasil, segundo o ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), “a partir das Constituições de 1891, 1934, 1946, 1967 e da Emenda Constitucional de 1969, o direito autoral em nosso país passou a ser expressamente reconhecido. No caso dos direitos autorais relativos às obras musicais, foram os próprios compositores que lutaram para a criação de uma norma para a arrecadação de direitos pelo uso de suas obras”.

O Copyright (©) (direitos de autor ou direitos autorais) visa proteger o autor da obra intelectual e impedir que suas criações sejam reproduzidas sem uma autorização prévia para o público, ou até mesmo que terceiros lucrem com suas obras. Já o Copyleft, ou livre direito de cópia, surgiu como um instrumento de democratização da cultura, que busca objetivar e oferecer aos criadores de conteúdo intelectual a opção de eleger quais os usos gratuitos de suas obras, seja por meio digital ou físico para a sociedade de um modo geral. Richard Stallman, programador e hacker, foi um dos responsáveis pela popularização inicial do termo copyleft, ao associá-lo, em 1988, à licença GPL (General Public License).

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O símbolo de copyleft é um © invertido.

Em 2001 surgiu o Creative Commons (CC). Organização sem fins lucrativos fundada por Lawrence Lessig,  professor na faculdade de direito de Harvard, que fornece uma condição de provisão de licença similar chamada share-alike (compartilha-igual), que permite a cópia e compartilhamento com menos restrições que o tradicional “todos direitos reservados”.

CC

Se um princípio fundamental da internet é a horizontalização na comunicação, num esquema people-to-people, modelos como o Creative Commons são alternativas de licença representantes desse sistema: posso criar e disponibilizar para que qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, use o meu produto, seja ele uma canção, um jingle, para qualquer fim. No Brasil, a discussão sobre o uso do Creative Commons é antiga e o seu uso começou a ser aplicado na legislação brasileira pelo Ministério da Cultura no ano de 2003, com o objetivo de possibilitar uma maior circulação das obras patrocinadas pelo governo federal.

No âmbito virtual da música, aplicar a lei do copyright torna-se uma tarefa um tanto quanto complicada, já que com o surgimento de plataformas digitais de compartilhamentos, as formas de se ouvir, comprar e divulgar música mudaram e são novas. Além disso, a lei atual de direito autoral no Brasil é de 1998, que aparece quando o mundo já está se digitalizando. A Internet não tinha ainda a abrangência que tem hoje, mas o mundo já tinha “adentrado” na era digital. Mesmo com o advento da digitalização mundial e dos downloads pela Internet, a lei com relação aos direitos autorais no Brasil ainda não se adaptou à nova realidade. Buscando modificar os impedimentos dessa lei, o licenciamento de obras em Creative Commons possibilita a autorização prévia de artistas sobre os usos de suas obras.

Em seu site oficial, o Creative Commons explica que não é contra os direitos autorais já que “as licenças CC são licenças de direito autoral e dependem da existência do sistema de proteção autoral para funcionarem. As licenças CC são ferramentas jurídicas que criadores e outros detentores de direitos podem utilizar para oferecer determinados direitos de uso ao público, reservando outros para si. Aqueles que desejam disponibilizar suas obras ao público para determinados tipos de uso, preservando alguns de seus direitos autorais, podem considerar a utilização de licenças CC. Pessoas que querem reservar todos os seus direitos estipulados pela legislação de direitos autorais não devem usar licenças CC. O Creative Commons reconhece a necessidade de mudanças na legislação de direitos autorais, e muitos membros da comunidade Creative Commons são participantes ativos no movimento de reforma da Lei”.

A partir daí, quando o autor passa a possuir uma autonomia maior para dispor de sua obra, ele pode, dentro do exercício livre de seu direito como autor, determinar que usos poderão ser feitos com a mesma. Ele que irá dizer se a sociedade pode usar a obra com ou sem fins lucrativos, se poderão somente copiá-la, se poderão modificá-la e criar outras derivadas como acontece no remix. Isso agrega muito para o uso e reaproveitamento de obras, o Creative Commons se presta muito bem para esta finalidade, uma vez que, por meio da licença, permite que as pessoas legalmente possam usar de uma obra com os fins determinados por seu autor.

Segundo o ECAD, responsável pela a arrecadação e distribuição dos direitos autorais das músicas aos seus autores, o direito autoral é “um conjunto de prerrogativas conferidas por lei à pessoa física ou jurídica criadora da obra intelectual, para que ela possa gozar dos benefícios morais e patrimoniais resultantes da exploração de suas criações”. 

Uma forma bem rentável para os artistas é disponibilizar as músicas em seus próprios sites oficiais para que os fãs possam baixar gratuitamente e ficarem mais conectados com seus universos de gostos musicais. Utilizando-se do Creative Commons, o artista pode não lucrar de maneira direta com a sua música, como acontece no Copyright, mas pode agregar outros valores à sua obra e lucrar de outras formas, como em realização de shows, já que a sua música “teoricamente estaria acessível e conhecida” pelo público de um modo geral. Isso já vem acontecendo com artistas no Brasil e em outras partes do mundo, pois é uma busca por um novo modelo de negócio, sabendo que o anterior já não funciona de maneira mais potente. Como por exemplo o cantor Luiz Caldas, que iniciou um projeto onde disponibiliza mensalmente no seu site músicas de sua autoria para download gratuito.

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Amadeus (2010) “indica a conexão existente entre as mobilizações colaborativas para o desenvolvimento de softwares livres e o pensamento hacker, que prega distribuir o poder e emancipar as pessoas pelo acesso às informações”. Fala ainda que “o verbo ‘hackear’ deve ser entendido como ‘reconfigurar’, explorar novas características, ir além do que os protocolos delimitaram, buscar a superação do controle”. Seria então o cantor Luiz Caldas, onde através do seu site oficial que disponibiliza suas músicas gratuitas, ser considerado um hacker? Dessa forma, desejamos um mundo onde haja mais compartilhamento de ideias e emancipação individual pelo conhecimento.

 

Referências:

AMADEU, Sérgio. Ciberativismo, cultura hacker e o individualismo colaborativo. Revista USP, São Paulo, n.86, p. 28-39, junho/agosto 2010.

https://br.creativecommons.org/

http://www.ecad.org.br/pt/direito-autoral/o-que-e-direito-autoral/Paginas/default.aspx

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9610.htm

http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/28120-direitos-autorais-sao-bens-nao-escassos-entrevista-especial-com-pedro-paranagua

https://pt.wikipedia.org/wiki/Direito_autoral

https://pt.wikipedia.org/wiki/Richard_Matthew_Stallman

https://pt.wikipedia.org/wiki/Copylefthttp://

https://www.luizcaldas.com.br/

Aplicativos: tradutores do mundo?

Para você, o que aplicativos de smartphone oferecem? A resposta para essa pergunta é extensa, afinal, existe uma infinidade de criações e intenções nas opções disponíveis. “O advento da Internet trouxe diversas mudanças para a sociedade. Entre essas mudanças, temos algumas fundamentais. A mais significativa é a possibilidade de expressão e sociabilização através das ferramentas de comunicação mediada pelo computador” e/ou smartphone. (RECUERO, 2009)

Tudo se torna mais fácil e acessível no mundo da tecnologia para aqueles que tem a possibilidade de possuir um smartphone, no quesito da sociabilidade e também da comodidade, muitas vezes ele contribui para afazeres importantes do dia a dia, estabelecendo uma nova forma de vida contemporânea, onde nos tornamos cada vez mais ligados as suas funções.

Mas afinal, o que são aplicativos? Aplicativos são softwares desenvolvidos para executar uma tarefa específica, quando instalados em computadores, tablets, leitores de livro, smartphones, ou até mesmo na nuvem. No campo da arte existem aplicativos cuja intenção é incentivar a sua criatividade e produção, como no caso dos musicais, disponibilizados para artistas criarem músicas sem precisar de instrumentos reais, onde apenas com cliques conseguem fazer o seu próprio som de uma maneira totalmente diferente do tradicional, mas ao mesmo tempo com um resultado não tão distante.

Para um violonista, por exemplo, é imprescindível ter um violão em bom estado para uma boa execução das notas e consequentemente um belo som, além do aperfeiçoamento das técnicas de aprendizagem. Para isso, faz-se necessário limpar o instrumento, afinar as cordas, guardar de forma correta, usar bons cabos e conectores, etc. Muitos músicos levam em consideração a marca do instrumento e cordas, o que confere um som característico, e em alguns casos gera até um status por usar determinadas marcas, onde os violões podem custar de R$130,00 até mais de um milhão de reais, como por exemplo o violão de Eric Clapton, da C. F. Martin & Company (circa 1939).

Muitos aplicativos que simulam violão, ou outros instrumentos musicais, são oferecidos de forma gratuita ou paga em sites como GooglePlay. Os aplicativos traduzem o mundo como qualquer outro tipo de mídia. Sendo que “no mundo estetizado no qual vivemos, a representação passa pela imediatez de um fato e de uma situação”. (PERSICHETTI, 2013). Dessa forma, aprender a tocar violão se tornou algo muito simples, prático e barato da forma como é oferecida na internet, onde os aplicativos prometem sons realistas, gravados com qualidade de áudio de estúdio, podendo ser executado em qualquer lugar, já que é um “violão virtual”.

“Super simples de usar! O REAL GUITAR é um aplicativo que simula um set de violão e guitarra realístico na tela do seu telefone/tablet podendo formar mais de 1500 acordes. Para tocar, basta tocar os dedos nas notas e o som do instrumento é reproduzido, simultaneamente. Um aplicativo divertido, fácil de usar e leve. Ideal para quem quer estudar ou tocar guitarra sem fazer muito barulho ou ocupar muito espaço”. (descrição do aplicativo Real Guitar no site play.google.com)

Para ver todas as funções do aplicativo, clique no link abaixo:
https://play.google.com/store/apps/details?id=br.com.rodrigokolb.realguitar

Outro exemplo de aplicativo de execução de instrumento é o popular Real Drum, que possibilita ao usuário tocar bateria de forma simulada. O aplicativo chegou a ser utilizado por Marcelo Bonfá, baterista da Legião Urbana, em um programa televisivo ao vivo. O episódio rendeu chacotas ao músico, o que demonstra que tal uso esbarra em uma questão cultural.

É fato que a liberdade de emissão de conteúdos musicas toma ampla proporção quando a internet se faz presente no cotidiano das pessoas, afinal, as conexões em rede computadorizada se tornam exponencialmente mais amplas. A questão é que não só a emissão, mas também a produção musical ganha novas possibilidades a medida em que a tecnologia avança.

O Garage Band por exemplo, é um aplicativo extremamente eficiente que, de forma resumida, disponibiliza ao usuário inúmeros recursos de gravação. Com ele, há possibilidade de se efetuar diversas simulações de instrumentos diferentes (para quem não os tem em casa), simulações de amplificadores e sistemas de efeitos, possibilidades de mixagem, além de tornar disponível que a pessoa utilize seus próprios instrumentos plugados no dispositivo. Diferentemente de usar um gravador de celular, o app abre um leque de opções para gravação em múltiplos canais, o que permite que o músico ou musicista possa trabalhar seus arranjos com clareza, e de forma independente.

É com sistemas como esse que os aplicativos vem se destacando também no meio musical, mudando a forma como as pessoas se relacionam com a música e fazendo com que ela se torne mais acessível, pela praticidade de confeccioná-la em seu próprio computador ou celular.
PERSICHETTI, Simonetta. Dos elfos aos selfies. In: KUNSCH, Dimas; PERSICHETTI, Simonetta (Org.). Comunicação: entretenimento e imagem. São Paulo: Editora Plêiade, 2013.

Recuero, Raquel. Redes Sociais na Internet. Porto Alegre: Sulina, 2009. (Cap. 1)

http://www.techtudo.com.br/listas/noticia/2015/02/conheca-aplicativos-para-criar-musica-no-android-e-no-iphone.html

https//www.colunatech.com.br/melhores-aplicativos-violao-para-android-9062/

http://www.portalserenata.com.br/cordas/violoes/cuidados-basicos-com-seu-violao

https://play.google.com/store/apps/details?id=com.vooapps.guitar

https://play.google.com/store/apps/details?id=com.gismart.guitar

https://play.google.com/store/apps/details?id=br.com.rodrigokolb.realguitar

https://top10mais.org/top-10-violoes-mais-caros-do-mundo/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Software_aplicativo

Quem Não É Visto, Não É Lembrado

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“Oi? Como assim? Você não tem face e insta? Eu tenho Whatsapp, Facebook, Instagram, Snapchat, Spotify, Twitter, Skype, Viber, Pinterest, Telegram, Wechat, Messenger, LinkedIn, Google+, Tumblr, Tinder e e-mail…”

Talvez o maior estranhamento nessa frase, para a maioria das pessoas, é o fato de alguém não estar conectado às redes sociais num mundo tão interligado, seja através de laços sociais “invisíveis”, seja através de likes nas publicações, ou participações em grupos com pessoas desconhecidas. O fato é que “é preciso ser ‘visto’ para existir no ciberespaço. É preciso constituir-se parte dessa sociedade em rede, apropriando-se do ciberespaço e constituindo um ‘eu’ ali. (Efimova, 2005 apud Recuero, 2009).

Recordo-me de uma frase que sempre ouvi de minha mãe quando ela se referia à questões profissionais: “quem não é visto, não é lembrado”. Acredito que tal ditado tem se aplicado cada vez mais de forma constante e intensa nas relações sociais atuais, onde as possibilidades de expressão e sociabilização aumentaram de forma significativa com o advento da comunicação mediada pelo computador.

Recuero (2009) nos lembra que “essas redes conectam não apenas computadores, mas pessoas”, e “quando uma rede de computadores conecta uma rede de pessoas e organizações, é uma rede social”. (Garton, Haythornthwaite e Wellman, 1997). As redes sociais na internet têm possibilitado interagir com pessoas do mundo todo, e isso é fantástico. Mas até onde podemos ir com esse fenômeno? Até onde a forma de interação nas redes sociais na internet interfere na nossa organização, no nosso modo de conversar, na nossa identidade, nas nossas relações sociais?

Tais relações tendem a ser as mais variadas possíveis visto à quantidade de informações que são trocadas a todo momento, em diferentes níveis e sistemas, em diferentes plataformas e aplicativos. Os objetivos são os mais variados, desde interesses profissionais, busca por grupos afins para discutir sobre qualquer coisa, criação de perfis com nome de usuário e foto em sites de relacionamento, onde talvez o objetivo maior seja construir e expressar a sua individualidade através de uma identidade, se tornando assim um ator social, num espaço privado que é público ao mesmo tempo, “na informação geralmente anônima do ciberespaço”. “Essa individualização dessa expressão, de alguém “que fala” através desse espaço é que permite que as redes sociais sejam expressas na Internet”. (Recuero, 2009).

perfil-e-as-preferencias-dos-brasileiros-nas-redes-sociais.jpg(“Redes conectam não apenas computadores, mas pessoas”).

Muitos desses atores sociais têm buscado novos amigos e até relacionamento de namoro em sites como Facebook e Tinder, por exemplo. Como os gostos e interesses que unem duas ou mais pessoas são os mais diversificados, há quem busque outros indivíduos por afinidade musical. Pensando nisso, empresas e desenvolvedores de sites e aplicativos têm oferecido algumas opções para aproximar pessoas e estreitar laços.

É o que aconteceu com o aplicativo de relacionamento e paquera chamado Happn. A pessoa usuária deste aplicativo pode ter encontros com outros usuários a partir da lista musical de seu perfil. Ao criar uma conta nesse aplicativo, a pessoa pode escolher uma música para ser tema do seu perfil ou as músicas com as quais ela mais se identifica. Essas músicas estão armazenadas no catálogo do Spotify e os usuários do Happn têm acesso graças à parceria em que as duas empresas fizeram.  Isso permite que os usuários do Happn se conheçam em um nível de profundidade maior através das interações que as músicas criam, além de diferenciar o aplicativo de outros concorrentes. É uma nova forma de conhecer pessoas, construir laços e, inevitavelmente, consagrar uma imagem nas redes, afinal, muitas pessoas o utilizam para formar uma imagem, para desenhar como querem aparecer para os outros.

Além disso, existem outros aplicativos de relacionamento específicos para música que visam unir pessoas com gostos musicais iguais para se conectarem, é o que o Bumble faz há algum tempo. O aplicativo funciona visando acabar com as divergências de gosto musical entre os possíveis novos casais e unir pessoas que compartilham as mesmas preferências e gostos musicais. O aplicativo consegue apontar para os seus usuários quais são os pares perfeitos cruzando informações de gosto musical de ambos os interessados por meio de suas contas pessoais no Spotify.

bumble-superswipe(O aplicativo Bumble serve para conectar as pessoas através do gosto musical).

Outro importante papel que as famosas redes sociais exercem no universo musical é o de compartilhamento e distribuição. Há quem prefira divulgar os seus trabalhos ou interesses musicais armazenando conteúdos em aplicativos. Muitos produtores, empresários, artistas independentes e até os já consagrados no meio musical divulgam os seus trabalhos em aplicativos e mídias digitais como o Spotify, o SoundCloud, “Palco mp3” e “4Shared”. Além de armazenar músicas e conteúdos no próprio aplicativo, o usuário do SoundCloud pode divulgar os seus conteúdos em outras mídias, por exemplo, sincronizando o seu perfil com o Twitter e Facebook para permitir que as suas divulgações possam atingir um público maior.

soundcloud-logo(O SoundCloud tornou-se uma das grandes mídias de divulgação musical da atualidade).

Além desses aplicativos de divulgação e armazenamento, existem também os próprios aplicativos oficiais que as bandas ou artistas criam para divulgar os seus próprios conteúdos. Com o intuito de interagir mais com os fãs e criar uma imagem, as bandas disponibilizaram fotos, vídeos, músicas e redes sociais em aplicativos para smartphones. É possível até sincronizar sua agenda no celular com a agenda da banda, por exemplo. Outras bandas foram além disso e criaram aplicativos oficiais e personalizados para divulgar informações históricas, datas de show, músicas, produtos licenciados e fotos inéditas e exclusivas, que só os fãs têm acesso através do aplicativo. Com toda essa interação, os artistas transformam os Aplicativos para Google Android e Apple IOS em canais próprios de divulgação de seus produtos.

Encontramos-nos em um paradoxo de um mundo tão interligado mas ao mesmo tempo com grandes distâncias entre seus habitantes. Há em questão uma atualidade tecnológica que tem em mãos artifícios tão interessantes para a sociabilidade que é importante tomar cuidado para que elas não sejam os únicos. Temos muitos acessos a aplicativos, armazenamentos, compartilhamentos, exposições em diversos meios de interação virtual. Por outro lado, é preciso saber lidar com aplicativos que podem parecer extremamente simples, mas que representam a estrutura de várias relações modernas.

Cruzando Tempos

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O progressivo número de formas comunicacionais existentes nos âmbitos tradicionais, digitais, emergentes que se relacionam no cotidiano da experiência humana, seja este integrando o sistema na forma de receptor ou de locutor, proporcionou o acontecimento de diferentes fenômenos midiáticos, um deles, popular nas áreas de distribuição, consiste em um único produto, ou mensagem, ser veiculado em diferentes plataformas de compartilhamento (digitais e off-line) com o objetivo de atingir de forma mais eficaz todo um público: é o Crossmídia. O termo tem origem na língua inglesa e seu prefixo significa atravessar, cruzar, o que nos auxilia a entender seu conceito: ir além de um único meio, transitar em diversos canais, tornar o conteúdo multidisciplinar.

No universo musical não é diferente, se ouve música hoje pelas mais diversas plataformas (veículos). Algumas delas mais “novas”, como os serviços de streaming e outras mais antigas como os CDs e o vinil. O que é mais interessante é que ambas coexistem, nenhuma foi extinta ou substituída pelo surgimento e popularização da outra.
Esse convívio crossmidiático nos leva a constatar que os meios por onde se escuta música interferem e modificam, na maioria das vezes, a recepção/ experiência do ouvinte, ou seja, que há uma diferença de comportamento e sentido proferida pelos veículos onde a música é tocada.

O disco de vinil ou LP (Long Play) surgiu em 1948 com o objetivo de reproduzir músicas através de um toca-discos. No material de PVC eram feitos microssulcos em forma de espiral da borda até o centro, permitindo que a agulha percorresse esse caminho, onde a agulhar ao vibrar emite sinal elétrico, que é amplificado e transformado em som audível. Essa gravação totalmente mecânica possibilitou diversas experiências com o vinil. O processo desde a captação do áudio à prensagem era completamente analógico. Cada estúdio tinha equipamentos e técnicas diferentes para cada etapa do processo, onde acabava trazendo para o álbum uma identidade própria devido as suas limitações e as formas de manobrá-las.

Já os serviços de streaming, tendo como principal exemplo o Spotify, foi lançado na Suécia em 2008, chegou ao Brasil em 2014 e já junho de 2017, contava com mais de 140 milhões de usuários ativos mensais e mais de 60 milhões de assinantes pagantes em julho de 2017.  As experiências que as plataformas de streaming possibilitam são as mais diversas, desde ter acesso a mais de 30 milhões de músicas, algo quase impossível de realizar com o vinil, visto que um LP pode variar de R$5,00 a mais de R$100,00 a depender de onde for comprado e do álbum, desde poder escutar música gratuita ou pagar o plano mensal no valor de R$14,90 com acesso ilimitado. O LP não precisa de sinal de internet e dados para funcionar, já o streaming só funciona se conectada a internet. Em alguns planos é possível sincronizar (quando on-line) a música no smartphone e utilizar off-line.

Dados do mercado norte-americano de 2014 mostraram que apenas dois formatos musicais cresceram no ano: o streaming e o vinil. Podemos interpretar o crescimento dessas duas mídias da seguinte forma: O streaming surge como alternativa eficaz e bem recebida pelo público diante da realidade pós-moderna na qual estamos nos inserindo. Dinamismo no consumo e amplo leque de possibilidades por um valor mais acessível, mas ainda se percebe uma grande procura por discos de vinil, o que justificaria isso?  Não podemos deixar de mencionar que essa relação com o streaming faz com que o comprador não tenha para si, a posse de uma música ou disco como acontecia com o consumo de discos, logo essa relação cultural ritualística do consumo a partir do material físico, se desfaz. A partir dessa premissa, fica mais claro inferir que as pessoas que ainda tem algo tipo de zelo e interesse pelo “ritual de ouvir musica” acabam, na sua maioria, por preferir o vinil, visto que é a mídia que ainda exige maior apreço pelo usuário, seja no cuidado com a limpeza do material, a demanda de trocar o lado para continuar ouvindo, ou o grande encarte que preza pela estética visual (mais até que os CD’s que se tornariam mídia principal posteriormente).

No que diz respeito a diferenças entre a experiência com o vinil e com o streaming, observando agora pela perspectiva dos artistas, é notório que o formato de vinil criou um paradigma na produção desses músicos e musicistas. Todos pensavam nesse formato de compilação de faixas que possuíssem algum tipo de relação entre si, seja em um disco mais conceitual ou um conceito mais aberto. Já que as pessoas consumiam essas obras enquanto unidade (o disco), esse formato se fez muito eficaz durante muitos anos. Hoje, com a era do streaming e das mídias sociais, esse formato ainda funciona e é muito usado, mas já começa a ser questionado. As pessoas ouvem cada vez menos um disco na íntegra, justamente pela flexibilidade proporcionada por essas plataformas. Os EP’s parecem estar aparecendo com ainda mais força que antigamente, e os artistas já repensam que uma musica bem escolhida a dedo, lançada como single e divulgada através de um bom vídeo-clipe, passa a ser rapidamente impulsionada pelos algoritmos, impulsionando também o sucesso comercial da canção e em consequência, o do(a) músico(musicista).

Com todas essas formas de ouvir e sentir a música, agradando a todos os gostos, tribos, idades, o vinil e o streaming convivem em harmonia. Só nos resta aguardar qual será a próxima mídia que virá para completar esse time.

Vaporwave – O Futuro do Passado

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O ciberespaço (lugar designado para as redes comunicacionais da computação) surge, assim como todo modo de vida conjugado pela humanidade, através da recombinação de diversos elementos que passam a constituir, na medida em que é reapropriados, relacionados e imitados, uma Cibercultura. Para o pensador André Lemos, a cibercultura é, por assim dizer um território recombinante na cultura contemporânea, o que nos leva a reconhecer a imensa capacidade criativa, produtiva e de certa forma, sagaz que esse meio proporciona.

Segundo André Lemos, “recombinar, copiar, apropriar, mesclar elementos os mais diversos não é nenhuma novidade no campo da cultura. Toda cultura é, antes de tudo, híbrida; formação de hábitos, costumes e processos sócio-técnico-semióticos que se dão sempre a partir do acolhimento de diferenças e no trato com outras culturas. A re-combinação de diversos elementos, sejam eles produtivos, religiosos ou artísticos é sempre um traço constitutivo de toda formação cultural”.De todo modo, a cultura digital sempre esteve atualizando elementos e se apropriando de variadas linguagens de outros espaços culturais com uma velocidade e alcances globais inimagináveis. Com o advento da cibercultura, surge uma relação que se estabelece de maneira muito estreita com as sociedades e as culturas contemporâneas. A cibercultura expande essa relação muito ímpar na sociedade, pois qualquer indivíduo pode conectar-se, publicar e informar em tempo real novos conhecimentos e informações de qualquer lugar do planeta para toda a rede.

Um grande exemplo dessa capacidade de geração e recombinação de símbolos no âmbito musical/estético que se faz presente na cibercultura é o Vaporwave, o movimento surgiu como um gênero musical no início da década de 2010 e foi evoluindo para um movimento artístico sob as esferas das novas culturas das mídias digitais na internet, apropriando-se de linguagens e nostalgias dos anos 80 e 90 para criar um universo muito particular e surrealista. A sua estética visual e sonora busca inspiração  nas esculturas clássicas, web design da década de 1990, vídeo games, renderizações de computador, Glitch Art, VHS, fita cassete, obras de arte da Ásia Oriental, cultura japonesa e cyberpunk. É justamente essa inspiração, e a busca nostálgica por esse recorte do passado, que os artistas utilizam como questionamentos e aplicam tratamentos modernos a clássicos retrô. É o futuro do passado.

Além de configurar-se como essa colcha de retalhos  do mundo digital e proporcionar ao ouvinte uma experiência sonora bem diferente ao mesclar, por exemplo, estilos como jazz de elevador e jingles publicitários, o vaporwave surge como uma crítica intríseca a cultura da internet. Um questionamento e uma resposta ao esgotamento autoral e aos direitos autorais que, na visão dos artistas, já foram todos infrigidos e que, é a apropriaçao criativa e justa que irá fazer com que o mundo evolua em suas diversas esferas culturais.

Assim, o Vaporwave é um movimento de vanguarda que se apropria da linguagem antiga e a repagina de acordo com a estética e problemáticas atuais, criando questionamentos sobre a sociedade de consumo, a música e a arte, aonde o digital é confrontado com o real e o artificial com o original. Criou fama ao disseminar-se em redes sociais como o Tumblr e o Reddit, crescendo ao ponto de ser considerado um dos mais importantes gêneros da música eletrônica contemporânea. É uma criação futurística que vem com a intenção de criticar a própria contemporaneidade, e a dependência que se formou diante dos seus próprios meios de produção. Um som abstrato e anestesiante, mixa um vazio repetitivo a emoção psicodélica, e constrói-se como uma manifestação artística que pode ser definida como inexplicável e mimética. Representa na prática a cibercultura e suas especificidades tão amplas e facilmente maleáveis.