A criatividade é essencial para a criação de qualquer expressão artística. Dentre as diversas formas de arte, a música destaca-se, sendo a mais difundida. E, por tocar no intelecto e na emoção humana, a composição de música por computador é um desafio às áreas de pesquisa em inteligência artificial e computação musical. Esse desafio é tão grande que, ainda hoje, poucos foram os avanços na área de simulação convincente da criatividade.
Dentre as diversas áreas de pesquisa em ciência da computação, sempre houve um foco especial à implementação de sistemas com intuito de simular a inteligência e criatividade humana. A inteligência artificial sempre se preocupou com o desenvolvimento de sistemas que ajudem a resolver problemas, do mesmo modo como os humanos raciocinam sobre o assunto. Outra área pesquisada pela inteligência artificial é a simulação da criatividade humana pelo computador.
Existe um algoritmo chamado “Peachnote” que calcula, a partir de um vasto banco de dados, a probabilidade de três notas em sequência terem sido compostas em certo período da história da música ocidental – pertencendo a uma obra barroca, clássica, romântica ou contemporânea.
Mais de 20 mil canções já foram adicionadas ao acervo – e o truque é nada mais que um palpite. Para adivinhar o período das notas, o algoritmo leva em conta os padrões de notas ou semitons da sequência tocada, para buscar canções similares no catálogo e determinar a época de origem do áudio reproduzido. Obras barrocas (de 1700 a 1770), por exemplo, costumam conter a sequência de notas dó, fá, sol, si e ré.
Mas o “Peachnote” pode não servir apenas para entretenimento ou pesquisas musicais. Estudos na área de reconhecimento de áudio já levam médicos a diagnosticar certas doenças ou estudar regiões do cérebro apenas ao executar gravações da voz do paciente em certas máquinas.
(Interface do algoritmo Peachnote)
A composição musical está inteiramente ligada ao processo criativo e inovador das pessoas e os meios utilizados para a sua divulgação. Na era digital, aonde as plataformas de streaming reinam e vinculam as novas formas de se fazer e ouvir música de maneira muito rápida e dinâmica, há várias formas de como divulgar uma obra musical e os artistas precisam estar antenados para não ficarem obsoletos. Se olharmos para a história da evolução musical poderemos observar as transições e mudanças graduais que a música foi tendo, desde os instrumentos, ritmos e gêneros até as formas de criação e divulgação em larga escala. As primeiras noções de teoria musical, e isso inclui a partitura, não deixam de ser algoritmos que serviram para a perpetuação e desenvolvimento do que existe hoje e se define como música.
Podem-se dividir os meios de composição algorítmica de muitas formas diferentes, e não há um consenso sobre essa divisão. É possível analisar como o algoritmo entra no processo de composição, e assim pode-se dividir em música composta pelo computador e música composta com o auxílio do computador. No primeiro caso, o algoritmo faz as próprias escolhas durante o processo. No segundo, os algoritmos apenas servem de auxílio ao compositor, ao qual coordena o processo de composição. Com o advento e evolução dos computadores no século XX, começaram a surgir trabalhos de composição algorítmica gerados completamente por computadores, como é o caso dos trabalhos produzidor por Lejaren Hiller, John Cage e Leonard Isaacson entre 1955 e 1956.
Pode-se também categorizar a composição algorítmica a partir dos resultados da composição. Nesses casos, os algoritmos podem prover informações para instrumentos musicais ou devem possuir maneiras independentes de síntese de som. Existe também a possibilidade de algoritmos que provenham ambos. Por exemplo, a execução de um algoritmo pode resultar em uma partitura, que pode ser utilizada por um instrumentista posteriormente, pode gerar um arquivo do tipo MIDI, ou então pode gerar o áudio através de uma mídia, que será executada por um computador ou outro dispositivo capaz de reconhecê-la, como um arquivo MP3. Mas até que ponto os algoritmos das plataformas digitais influenciam o público? quando os serviços de streaming priorizam o que quer que seja que os dados mandam os assinantes ouvirem, a marca musical e pessoal de um artista passa a valer menos, e a capacidade de selecionar sons que representam músicas desejáveis, em termos algorítmicos, torna-se crucial. Podemos ver esses exemplos em plataformas como o Youtube e o próprio Spotify, aonde já foi comprovada a existência de “fazenda de cliques” com a intenção de viralizar conteúdos, independente da qualidade e pesos artísticos.
No que diz respeito ao uso de algoritmos para gerar uma composição, é interessante notar o quanto essa discussão se assemelha com o uso dos mesmos no universo jornalístico. Algoritmos de fato são proativos e capazes de suprir a necessidade de profissionais da área da comunicação? Assim como, será a eficácia dos algoritmos suficiente para substituir o trabalho de um compositor? Pois bem, é notório que os algoritmos podem servir como bons auxiliares em ambos os casos, mas da mesma forma que um jornalista tem capacidade não apenas de compilar dados e informações, mas de analisá-las e refletir sobre elas criticamente, a música precisa de mãos, corações e cérebros humanos para que haja um sentimento genuíno expresso através daqueles sons. Em diversas tentativas de se aperfeiçoar a composição por algoritmos, as conclusões sempre acabam girando em torno do mesmo ponto: As composições são frias e distantes de uma expressividade.
Dentro da história, os algoritmos estão presentes na música desde os primórdios das primeiras teorias e partituras, e vêm se reinventando de maneira muito rápida, através das novas tecnologias digitais. A criatividade humana impulsiona essas mudanças, porém, os algoritmos composicionais quanto à maneira como eles processam os dados musicais e pela sua estrutura. Por outro lado, os algoritmos composicionais feitos por computador ainda encontram muitos obstáculos, pelo fato de serem de grande complexidade a implementação de sentimentos, emoções e intenções em máquinas autônomas.
Indicações e referências:
Lejaren Hiller: Computer Cantata (1963) – (https://www.youtube.com/watch?v=85fvyWJFq20).
Minstrel: Composição Algorítmica para Leigos em Música – MATHEUS MARCHINI (https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/147613/000999689.pdf?sequence=1).
Aprendizagem de Maquina: Supervisionada ou Não Supervisionada? (https://medium.com/opensanca/aprendizagem-de-maquina-supervisionada-ou-n%C3%A3o-supervisionada-7d01f78cd80a).
Textos Saad, B. Algoritmo Curador; D’Andrea, C. Em busca das redes sociotécnicas.